segunda-feira, 11 de julho de 2016

escrituras

de repente tudo são retângulos de mondrian: amarelos, vermelhos, azuis e vazios. ao invés de simples, complicadíssimos. ao invés de apreensíveis, tão distantes. ao invés de receptivos, muros. é a complexidade. é a realidade nova, resumida a pixels. é a radiografia do meu cérebro enquanto escrevo.

quando sento minha mão nas palavras, elas escorregam. minha cabeça não vai às nuvens, ela é a nuvem. carregada. por mim? não, de mim. de mim, sobrecarregada.

eu fico de quatro tateando no escuro o chão à procura do que dizer. sempre assim, um jogo de esconde-esconde que só começa quando eu fico cego. nu em mendicância. esse sou eu, antes de mais nada. o fato de escrever, o fato de cegar, me faz virar os olhos para dentro de mim, em direção ao crânio. ao osso. e só. então eu tenho que me virar comigo mesmo. me desdobrar. e é aí que eu não me acho.

vem retângulo, vem pixel. tudo se resume, mas nem por isso fica mais fácil. me diz o que um sumário diz. me conta o que uma sinopse conta. eu quero escrever, mas sou só palavras-chave. por isso o desespero. corro contra o tempo todo o tempo atrás de frases que me organizam. as letras não me representam, mas só com elas eu consigo me organizar. como? as letras perdidas em mim não são nada se não as vejo.

por isso, aos poucos, os olhos cegos não resistem à curiosidade e voltam a enxergar, agora, a palavra edificada, levantada da devastação. sentem o processo, mas às escuras, só sentem o calor da febre. ao acordar, uma pequena amostra de mundo organizada. um retalho rasgado nos dentes. pedaço de ser. quando eu vejo a dimensão da palavra eu sinto. mas não sei.